E se não tivesse morrido dessa maneira?
Ainda assim teria morrido, talvez até mais desgraçadamente!
Teria morrido de tédio, dentro de casa, sendo engolido pelas paredes que o cercavam, pelos amados muros que o protegiam, que o isolavam do mundo real, do sensível.
Teria falecido de cansaço, porque não se reinventar é doloroso, pois é saber que tem muito lá fora, que ainda há uma vastidão para ser desvendada, mas não será, por comodidade.
Teria se acabado lentamente, pouco a pouco, dia após dia, porque a rotina é difícil, ela é monótona, ela nos escraviza, nos transforma em seres reprodutores, tira de nós o que nos diferencia, o que tanto sentimos prazer de ostentar, a humanidade.
Teria se esvaído de velho, antiquado, esquecido, porque deixar de manter contato é não ser lembrado, fechar-se em sua fortaleza é assumir a solidão, é negar que existe o novo, é ainda ter medo da chuva.
Teria já sucumbido, porque morrer é perder a vida, e bem, uma vida foi perdida, desperdiçada.
Teria já morrido, pois já havia abandonado a esperança, porque tinha perdido o gosto pela vida, por experimentar, por se aventurar, por ser, porque ser é importante, é identificar-se consigo, é plenitude.
E por fim, teria alcançado igualmente a morte, até mesmo de piores maneiras, aquelas vagarosas, quando você vai se perdendo aos poucos, deixando de ser, esquecendo, entregando-se, e eis o pior tipo de morte, quando ainda se está vivo.