Aqui não estamos todos nus
Quem me dera se todos nós estivéssemos vivendo despidos, sem qualquer armadura ou casca, dispostos realmente à vida, sem nenhum tipo de segunda intenção ou proteção, apenas puros, nus.
Residimos numa época em que muito é forjado, demasiado manipulado, somos cheios de fins, mas não definimos os meios, queremos muito, mas sequer ousamos sair da nossa zona de conforto.
Pouco vemos singeleza, simplicidade nas vivências, se fazemos determinada coisa necessariamente tem que haver algo em troca, temos vivido abarrotados de resultados, mas sem procurar entender o que nos levou até ali ou mesmo como chegamos.
Infelizmente a malícia tornou-se banal, passamos a ver a inocência com aversão, o inocente como bobo, tolo; levamos muito a sério o mundo é dos espertos, e hoje nem mais sabemos em quem confiar, se o sagaz que é o pateta ou se o pateta é que está sendo sagaz.
Continuamos procurando sempre grandes consequências, experiências hercúleas, e por somente as ver desprezamos as simplórias, ao invés de dez pequenas preferimos uma grande, e assim vamos sendo frutos de poucas vivências, moldados em poucos momentos.
Corremos atrás da intensidade mas esquecemos de colocá-la onde vamos, estamos sempre a esperar uma intervenção externa, queremos o pronto, e abandonamos o fazer; ao invés de cultivarmos nosso pomar, preferimos apreciar o do outro, que pode nem mesmo ser bonito, mas só por não termos um cuidado, qualquer outro faz-se encantador.
Por isso que não estamos nus, nascemos e falecemos assim, chegamos de mãos vazias e assim vamos, mas jamais lembramos disso, preferimos dessa maneira não continuar. Escolhemos viver armados, vestidos de quem não somos, trajados de outros personagens, cobertos por ilusões, abdicando da nudez, da naturalidade, de sermos quem podemos ser, dos sonhos que podemos ter, de vivermos de verdade, em sua plenitude, nus.
E por fim, no fundo, de vez em quando todos procuram momentos de nudez, apesar de tudo, sabem o quão importantes eles são, do valor de ser você mesmo em alguns momentos, de andar pelado em um mundo pudico, de estar despido quando tudo é vestimenta.